Relato de uma bailarina (quase) engolida pelas redes sociais

Está muito difícil passar por essa pandemia que nos coloca longe das pessoas não é mesmo? E a necessidade de contato nos fez ir pras redes “sociais”. E é claro que as redes sociais perceberam isso. Como empresa, elas também precisam sobreviver. Então passamos a fazer parte de um jogo, mas nós, somos só as peças que tem que seguir as regras. 

Para engajar temos que produzir conteúdo, de que? Qualquer coisa. Não é necessário ter estudo, ou ser especialista, é só fazer algo colorido, mais ou menos embasado, que mostre uma realidade distorcida perfeita e utópica e que respeite horários, dias e hashtags. Se não fizer tudo direitinho ainda corre o risco de sofrer bulling tecnológico, o tal o shadowban.

E ai eu me vi presa dentro desse jogo. Competindo para criar conteúdo de anos de estudo em 140 caracteres e que foram acabando com a minha felicidade de fazer ciência, de fazer arte, de ser professora, de ensinar. Como posso querer que alguém pague pelos cursos que eu e tantos outros professores criam se entrar no instagram e clicar na bandeirinha de salvar um post me faz ter uma biblioteca de “conteúdo” gratuito diretamente no meu celular?

Então passei a ficar deprimida vendo os conteúdos criados, não só porque muitos não estão 100% corretos, mas porque essa produção em massa não faz sentido e acaba passando por cima da ética de qualquer profissão e criando problemas psicológicos que não são fáceis de serem tratados e que podem afetar a carreira e vida de muitas pessoas. A realidade que é criada no Instagram não condiz com a realidade do mundo real. E os padrões de bailarinos, por exemplo, criados nessas redes podem fazer com que muitos bailarinos talentosos desistam achando que nunca chegarão neste padrão. 

Por isso resolvi abandonar essa ideia, em prol da minha saúde mental. Mesmo porque nunca aceitei de fato todas as regras impostas. Por um tempo achei que precisava ser Jesus e ter um milhão de seguidores para espalhar a minha palavra. Mas ao lembrar que não quero espalhar palavra nenhuma consegui sair dessa ilusão. Quero compartilhar, ensinar e aprender. Isso não é possível nas redes sociais. Mesmo as Lives criadas, em teoria, com esse objetivo, não cumprem esse papel. Porque o instagram trabalha com o imediatismo, com a imagem e com a rapidez. Dai o reels com até 30 segundos, os stories em blocos de 15 segundos e o feed com a ideia de que uma imagem vale mais que mil palavras. Mas estudar requer palavras! Leitura de livros e artigos. Também requer assistir aulas, cursos, e palestras que não cabem em 15 segundos.

O mais engraçado é que o tempo dedicado para produção desses 15 segundos de conteúdo, que vai desaparecer em horas, é gigantesco. E não quero que minhas pesquisas desapareçam em horas, quero que os bailarinos possam ler, pensar e agir com base nelas. Então já te digo, se você quiser compartilhar não compartilhe o meu post no Instagram, compartilhe comigo la na Plataforma EAD Bastidores. E não será só comigo, mas com diversos outros professores que também produzem ciência na dança. 

Não estou aqui para fazer propaganda de um curso específico com vagas limitadas e preço promocional por tempo desconhecido para apelar para a sensação de escassez e medo de ficar de fora. Não, o que está na Plataforma estará esperando por quem quiser ir aprender, quando quiser ir aprender. E Sim, os cursos são pagos. Porque produzir conteúdo de qualidade custa caro, custa o tempo do professor, o investimento que ele fez na formação dele, os equipamentos no laboratório para a realização das pesquisas e é a remuneração para que ele possa viver. É sua profissão.

O Bastidores não vai sair das redes sociais mas não vai ser mais um escravo delas. Vamos usar as redes sociais ao invés de ser usado. Para isso também estamos lançando o quadro “Pílulas da Bárbara”. A ideia desse quadro é ajudar a engolir coisas que são dificílimas de engolir. Mas também não vamos fazer o papel de Mary Poppins e colocar um pouquinho de açúcar para ajudar a engolir aquilo que faz mal para o seu corpo. 

Não queremos conteúdo coca-cola que parece matar a sede com o gás carbônico explodindo na sua garganta fingindo refrescância e que te deixa excitado de tanto açúcar e cafeína mas que no fundo te mata pouco a pouco. As pílulas vão te ajudar a engolir aquilo que é bom pra você, sem te empurrar goela abaixo um tanto de coisa que você não sabe pra que, por que e como.

Quero voltar a falar das coisas que me excitam, que me inspiram e que me indagam, sem me preocupar com o formato ideal para “alcançar mais pessoas”. Se uma pessoa for alcançada e quiser embarcar nessa jornada comigo já estou feliz. Porque serei eu mesma, sem filtro, sem maquiagem, com minhas rugas e minhas olheiras. 

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